Sumário (Clique nos títulos para acessar editorial ou resumos disponíveis)
Neste número, procuramos priorizar a produção de colegas da Febrapsi e, ao mesmo tempo, oferecer a possibilidade de contato com o pensamento de autores franceses que estiveram recentemente no Brasil, participando de atividades científicas e apresentando sua produção psicanalítica. A decisão de lançar “Outras palavras” representa o desejo da equipe de acolher os trabalhos recebidos pela rbp, independentemente dos temas pautados pelo projeto editorial.
Por ser de âmbito nacional, a rbp tem a capacidade de socializar o que é produzido na Febrapsi e na IPA e divulgar o que é pensado e debatido além de nosso território institucional. As revistas temáticas cumprem esse objetivo recortando temas e aprofundando debates. Este número, porém, pode ser visto como uma fotografia do que chega espontaneamente, sem o estímulo de uma proposta temática. Assim, circulando por outras palavras, por outros pensamentos, oferecemos um espaço mais livre para diferentes tipos de trabalho.
Começamos, na seção “Diálogo”, com uma entrevista realizada pela equipe editorial com os psicanalistas franceses Emmanuelle e Bernard Chervet, quando estiveram em São Paulo a convite da diretora científica da SPBSP Silvana Rea e de sua equipe, a quem agradecemos por nos ceder as conferências que eles proferiram na ocasião, também publicadas neste número. Com isso, o leitor tem a oportunidade de conhecer os autores pela entrevista e de se aprofundar no pensamento deles por meio de seus textos.
Em “Outras palavras”, temos um artigo de Anne Brun, psicanalista francesa que veio ao Brasil em abril de 2018 e participou de um seminário organizado pela rbp em parceria com a SBPSP.
“História da psicanálise”, por sua vez, traz um breve artigo do colega Sergio Lewkowicz sobre a história da psicanálise em Porto Alegre. São depoimentos e reflexões que nos ajudam a formar um panorama da história da psicanálise no Brasil no âmbito das Sociedades pertencentes à IPA.
Em “Projetos e pesquisas”, podemos acompanhar o trabalho dos colegas Rogério Lerner (SBPSP) e Marlene Guirado (USP), que discutem uma pesquisa em psicanálise realizada numa instituição de atendimento clínico e educacional. Com essa seção, vale ressaltar, pretendemos dar um passo à frente na construção de um espaço experimental, que permita a troca de conhecimento sobre projetos e pesquisas coordenados por psicanalistas. A perspectiva é dar voz a novas propostas de intervenção psicanalítica institucional e/ou a reflexões sobre as formas de pesquisa em psicanálise, em todas as suas múltiplas expressões. Trata-se de um espaço plural, de acolhimento das diferentes maneiras de entender o que é a pesquisa em psicanálise. É uma seção permanentemente aberta ao debate e ao novo que surge da produção de colegas, dentro e fora da Febrapsi.
No material recebido e organizado, buscamos descobrir os temas que floresceram nesse período de trabalho editorial da equipe. Algo que se destacou foi a noção de diálogo livre, para além das escolas psicanalíticas. Apareceram trabalhos cujas influências verticais são cruzadas por influências horizontais.
O que apresentamos é uma pequena amostra do panorama de uma nova geração de analistas, que pensa a psicanálise com a liberdade de construir os debates horizontalmente, ou melhor, que produz conhecimento por uma gestão compartilhada do patrimônio psicanalítico legado por Freud, e não por uma verticalização hierárquica geracional.
Em suma, é uma produção para além dos autores que fizeram escola, uma reflexão sobre a psicanálise que, após a era das grandes escolas, abre novos caminhos. Podemos sentir as mudanças na psicanálise. Que venham os bons ventos!
Marina Massi
Editora
A exploração das novas formas da clínica contemporânea, especialmente das patologias graves, motivou os psicanalistas a conferir uma atenção cada vez maior à sensório-motricidade nas clínicas consideradas difíceis. A abordagem terapêutica dessas patologias narcísico-identitárias necessita de conceitualizações que permitam pensar a importância do sensorial, do corpo e da motricidade. De modo geral, constata-se que a maioria dos teóricos analistas do século xxi foi confrontada com a necessidade de introduzir conceitos específicos para pensar e se encarregar das clínicas decorrentes de situações-limite e extremas da subjetividade. O ponto em comum dessas novas contribuições teóricas consiste em explorar os efeitos das primeiras experiências sensório-afetivo-motoras na relação com o objeto, as quais representam um papel essencial na aplicação dos processos de simbolização ou em sua falência. Discutem-se diferentes modos de escuta e de intervenção do analista, que colocam em jogo as formas primárias de simbolização.
Palavras-chave: arcaico, interpretação, patologias narcísico-identitárias, sensório-motricidade, significante formal
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Neste texto, aborda-se a mentira a partir do estudo de obras literárias, mitos, situações sociais e da clínica psicanalítica. Propõe-se uma classificação das mentiras utilizando o continuum narcisismo ↔ social-ismo. Discutem-se, em particular, a mentira narcísica e a mentira perversa, levantando-se hipóteses sobre sua dinâmica e suas funções nos grupos e na sociedade. Vinhetas clínicas mostram como a mentira consciente se articula com outras defesas, constituindo-se organizações narcísicas perversas, que buscam desumanizar o objeto e destruir a percepção da alteridade. As organizações defensivas protegem da desestruturação psicótica e da revivência de traumas primitivos. O sentimento de não existência é substituído por uma fachada de excitação perversa e fruição sádica. Objetos mentirosos, fraudulentos, suspeitos, não confiáveis revelam-se nas tramas encenadas no campo analítico. Conluios perversos entre os membros da dupla analítica podem não ser identificados, eventualmente ativando condutas não éticas do analista.
Palavras-chave: mentira, perversão, organizações narcísicas, conluios perversos, campo analítico, enactment
As ideias aqui desenvolvidas visam exercitar um pensamento sobre o complexo de castração, conceito secular da metapsicologia freudiana, em seu vínculo com o pulsional: morte e vida. O objetivo é estabelecer um diálogo com as novas configurações, que vêm produzindo diversas e inquietantes roupagens, desafiando as soluções até então fixadas pela ordem social. Diante desse contexto, busca-se refletir a respeito da pertinência desse complexo – em sua intrínseca relação com o complexo de Édipo – como organizador por excelência da psique e, por conseguinte, da cultura.
Palavras-chave: castração, Édipo, pulsão, novas configurações
Neste trabalho, estuda-se o funcionamento do ego-realidade inicial, em particular as defesas funcionais e patológicas utilizadas pelo recém-nascido para tramitar as exigências pulsionais, com destaque para a projeção, a qual se encontra na base do surgimento do afeto e da formação da barreira de proteção antiestímulo, cujas falhas abrem caminho para o contágio orgânico-afetivo patológico na relação mãe-bebê, podendo estender-se aos relacionamentos da vida adulta e ao setting analítico, com expressão na contratransferência.
Palavras-chave: ego-realidade inicial, libido intrassomática, contágio, projeção, contratransferência
Este artigo tem por objetivo expor e analisar a ideia de self na psicologia psicanalítica do self, de Heinz Kohut. Para isso, vamos apresentar as duas fases da concepção de self existentes na obra do autor – a saber, self no sentido restrito, anterior a 1975, e self no sentido amplo, posterior a essa data –, levantando questionamentos e discutindo os textos do autor. Afirmamos que existe, na teoria kohutiana, uma definição fenomênica e outra metapsicológica para o self. Enquanto a primeira permanece relativamente constante em toda a obra do autor, a definição metapsicológica sofre alterações. Quando o self é concebido num sentido restrito, ele é considerado um conteúdo das instâncias psíquicas; já depois de 1975 passa a ser visto como uma estrutura supraordenada, independente dessas instâncias. Nesse último momento, o modelo metapsicológico proposto por Freud torna-se menos importante para Kohut, que rompe com a teoria que chama de clássica.
Palavras-chave: self, Kohut, narcisismo
Neste artigo, descreve-se o caso clínico de um paciente borderline, cujo self era inicialmente formado por uma hipertrofia da área intelectual e que, ao longo da análise, veio a conquistar um corpo próprio e, com isso, uma unidade psicossomática. Essa descrição tem a finalidade de mostrar que, na perspectiva winnicottiana, existem outras possibilidades de interpretar os sonhos em casos de patologia borderline, possibilidades que escapam à teoria dos sonhos proposta por Freud. Não se pretende fazer uma revisão da teoria freudiana, o que exigiria um estudo à parte. Conclui-se que, na perspectiva winnicottiana, o sonho geralmente traduz características do estágio de amadurecimento em que o paciente se encontra.
Palavras-chave: patologia borderline, personalização, unidade psicossomática, sonhos
O autor apresenta sua visão sobre a história da psicanálise no Rio Grande do Sul desde a década de 1970 até os dias de hoje, período de sua formação médica, psiquiátrica e psicanalítica. Descreve também um pequeno levantamento que realizou com colegas brasileiros, concluindo que talvez no Brasil possamos falar de uma psicanálise pós-colonial, “mestiça”, que está buscando sua identidade em um processo paralelo ao do nosso país na contemporaneidade. Processo que implica a desidealização do estrangeiro e a recuperação do valor do nosso.
Palavras-chave: história da psicanálise, psicanálise brasileira, idealização do estrangeiro, psicanálise pós-colonial
Neste trabalho, o método de análise institucional do discurso foi empregado para estudar como se constrói um caso clínico numa instituição de atendimento psicanalítico para crianças com autismo, e quais são os princípios pelos quais se dá tal construção e se desdobram as relações decorrentes, tanto dos profissionais entre si como deles com os clientes ou com os profissionais de outras instituições. Essa proposta é original, como também o fato de o pesquisador ser parte da equipe da instituição. Foram analisados dois tipos de material: 1) entrevistas realizadas com membros da instituição; 2) relatos clínicos feitos pelo próprio pesquisador após os atendimentos, bem como da supervisão de alguns desses atendimentos com o profissional de referência da instituição. O discurso psicanalítico é hegemônico, mas não exclusivo, na constituição das cenas de atendimento. Revelaram-se embates e tensões entre as distintas modalidades discursivas que compõem a instituição. As consequências desses embates são discutidas.
Palavras-chave: autismo, psicanálise, análise institucional do discurso
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